Dono das Auroras

 

 

 

Patrice Murciano

 

 

 

Quando eu crescer
Do tamanho de um seixo rolado
Quero estar debaixo de uma árvore frondosa
Que me faça sombra no verão
E que me cubra com folhas de outono quando o tempo virar

 

Vou estar solto
Assim, parado
Livre para ir onde queira
Como nunca estive
Quando tive pernas

 

Vou ser dono das auroras
Libertando madrugadas
Não vou deter mais pensamentos
Não vou mais me deter, sequer em mim
Una consciência, apenas

 

Ah, quem diz que uma pedra não pode ter consciência
É um ser limitado

 

Para a pedra pequena, que serei
A realidade será hiperbólica
Lugar de seres transfacetados que incluem pedras

 

Seixo rolado
Branco
De areia
De rio piscoso, vim dar aqui
Depois de ver tanto horror e maravilhas
Vim descansar meus pensamentos
Do vão sofrimento
Dos fins

 

Vim ser dono das auroras
Desmanchando hojes nos amanhãs
E enquanto o tempo durar
Estarei aqui, debaixo da árvore generosa
E vejo já, tanta cor

 

 

 

Painting by Patrice Murciano

Apocalíptica

Nathan Wirth

Seagulls – Nathan Wirth

 

 

 

 

 

Acho um pouco triste a cor que não existe.

Acho triste não poder imaginar.

Acho muito, muito triste, trocar os sins pelos nãos.

 

 

Mas, será num dia, num país de utopia,

Que da soma dos nãos emergirá um sim.

 

 

Sim, a cor.

 

 

 

Fortaleza Agreste

 

 

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Parecia tão simples,
retornar ao bosque de ameias da lua e reencontrar o poema perdido.

Talvez caído entre as folhas pardas, próximo do lugar onde tombou
no último outono.

Mas, talvez, revolvido pelo vento invernal, tenha se dissolvido no espaço
ou se afogado em algum ribeirão.

Não reencontrei meu poema.
E dos mil que havia semeado, no ar quebradiço do oeste, nenhum vingou.

Mas o bosque de poesia e mistério permanecia intacto, pleno verde azul,
selvagemente agreste.

Voltei para casa com as mãos cheias de sol.

 

 

 

Oxalá!

 

 

"Conhece-te a ti mesmo."

 

 

 

Quisera

rolasse

com o sal

das lágrimas

todo mal

e tristezas

face afora

 

E assim

com os olhos

límpidos

retornar

ao estado

natural

de ver

lucidamente

 

Oxalá

os dois olhos

da face humana

enfim

se vissem!

 

 

 

 

Brisa

 

 

 

 

 

 

 

 

Pelo muito preciso mas inefável
Sentimento
Que de ti se alastra
Percorrendo as veias dos vales
Saciando a sede das almas
Até desaguar no mar indistinto do esquecimento

 

Eu só queria agradecer pelos campos verdes

 

 

 

Crop circles in natura

 

 

 

 

Lições para não esquecer:

Aprender com a terra a quietude das pedras;

 

aprender com as pedras a silenciar os segredos da terra,
a se deixar esculpir pela água;

 

aprender com a água a penetrar no mais fundo dos elementos,
a ser com os seres, a se transformar;

 

aprender com o fogo a ser o agente da transformação,
a se moderar com a água, a se alimentar de vento;

 

aprender com o vento a correr pelos campos sem cancelas.